Chácara dos avós e 'fuga' para a França: como foi a infância e início de carreira de Niède Guidon, arqueóloga que morreu aos 92 anos

  • 04/06/2025
(Foto: Reprodução)
Arqueóloga que nasceu em Jaú (SP), morou em Pirajuí (SP) e trabalhou em Itápolis (SP) morreu na madrugada desta quarta-feira (4) em São Raimundo Nonato (PI). Morre no Piauí a arqueóloga Niède Guidon - grande defensora do Parque Nacional Serra da Capivara, onde encontrou vestígios dos primeiros habitantes do continente “Tinha muitas plantas frutíferas, gostava muito de subir em árvores, vivia no alto daquelas mangueiras imensas. Foi uma infância muito agradável”, assim descreveu Niède Guidon sua infância em Jaú, no interior de SP. 📲 Participe do canal do g1 Bauru e Marília no WhatsApp A arqueóloga nasceu em 12 de março de 1933 e morreu aos 92 anos, na madrugada desta quarta-feira (4), em São Raimundo Nonato (PI).que Niède liderou escavações no Parque Nacional da Serra da Capivara que mudaram o entendimento científico sobre a presença humana nas Américas. Pesquisadora respeitada, foi professora universitária, membro titular da Academia Brasileira de Ciências e grande oficial da Ordem Nacional do Mérito Científico. A arqueóloga Niède Guidon fotografada no Piauí Foto: André Pessoa Infância no interior de SP A família paterna de Niède Guidon tem origem na região da Savoia, nos Alpes, na fronteira entre Itália, Suíça e França. Seu avô paterno era francês, e seu pai nasceu na Itália. O avô imigrou para o Brasil e se estabeleceu em Jaú, onde fundou uma empresa de importação de vinhos e azeites europeus e exportação de café. A família materna já era natural de Jaú. Em entrevista ao Museu da Pessoa, concedida em 2007, Niède contou que os avós tinham uma chácara no fim da Rua Treze de Maio, onde gostava muito de passar o tempo. “Minha mãe era professora, o meu pai era funcionário público também. E eu gostava muito de ir à casa de minha avó. Quando a gente atravessava a rua, os moleques mexiam muito comigo, porque minha mãe tinha o costume de me vestir com roupas da Ilha da Madeira. Os moleques achavam muito esquisito meu irmão e eu vestidos de marinheiro. Mas eu gostava muito da chácara da minha avó porque tinha muitas plantas frutíferas, gostava muito de subir em árvores, vivia no alto daquelas mangueiras imensas”, contou. Chácara onde morou família de Niède Guidon em Jaú (SP) Raíssa Toledo/TV TEM A antiga chácara da família abriga, atualmente, uma casa de repouso no fim da Rua Treze de Maio, já no início da Avenida Zezinho Magalhães. Em entrevista ao g1, o historiador e arqueólogo jauense Fábio Grossi lembrou o contato que teve com Niède em uma conferência realizada na cidade em 2005. “Ela comentou que brincava de andar no trilho do trem aqui em Jaú. Que o pai dela vendia vinho, inclusive ela herdou esse gosto de vinho dele. E aí ela se mudou pra São Paulo, onde se tornou arqueóloga do Museu Paulista, que é o Museu do Ipiranga”, contou. Antes de se mudar para São Paulo, Niède passou boa parte da infância e juventude também em Pirajuí, para onde a família se mudou após o falecimento da mãe, quando ela tinha seis anos. Depois disso, o pai se casou novamente. Vista aérea de Jaú, na decada de 1960 Solutudo/Reprodução Ela foi aprovada no vestibular para o curso de História Natural na Universidade de São Paulo (USP), que concluiu em 1958. Nesse mesmo ano, retornou ao interior de SP. Niède foi aprovada em um concurso público em Itápolis (SP) para lecionar na escola da cidade, junto de outras quatro colegas, também formadas pela USP. “Lá, houve todo um entrevero! Nós éramos em cinco professoras diplomadas pela USP, com concurso, que chegamos juntas, e até então o colégio local tinha professores que eram advogado ou farmacêutico. Houve um movimento contra a gente. Sem contar que duas colegas e eu não íamos à missa. O padre começou a dizer que nós éramos comunistas, e ser comunista naquele tempo era uma coisa muito grave. Então a Secretaria da Educação achou melhor nos tirar de lá e nos levou pra São Paulo. Daí me colocaram no Museu Paulista da USP”, contou na entrevista de 2007. No Museu Paulista, hoje Museu do Ipiranga, foi direcionada à área da arqueologia. Como falava bem francês, idioma aprendido com o avô em Jaú, seguiu para a França para se especializar. Museu do Ipiranga, na Zona Sul de São Paulo, em imagem do dia 7 de setembro de 2022 Celso Tavares/g1 “Eu falava francês porque, quando eu era pequena, o meu avô me ensinou a cantar a Marselhesa. Lá em Jaú. Ele me punha em cima da mesa e dizia: ‘Canta’. Se eu cantava direitinho, eu ganhava uma moeda de 400 réis, o que dava pra comprar um monte daquele algodão doce, que era proibido comer, minha mãe não gostava dessas coisas compradas na rua. Mas eu ia, comprava e ficava debaixo da escada comendo. Então eu ouvia meu avô falando francês”, lembrou. Após o período de estudos na França, voltou ao Brasil em 1963 com o diploma de arqueóloga. Em 1964, com a chegada da ditadura militar, sua comissão na USP não foi renovada. Niède foi denunciada como integrante do Partido Comunista e alertada pela tia a deixar o país imediatamente. Embora negasse qualquer filiação política, seguiu o conselho e partiu novamente para a França. “Uma tia minha chegou e disse: ‘Hoje mesmo você vai embora, você foi denunciada como sendo membro do Partido Comunista’. Eu disse: ‘Eu não sou membro de partido nenhum, porque eu não acredito na política’. Ela disse: ‘Não, mas você foi denunciada’. Eu disse: ‘Mas eu não sou membro do partido, eu posso provar que eu não sou’. Ela disse: ‘Até você provar, você já apanhou tanto que é melhor você ir embora hoje’. E me botou no avião. Então, de um dia pro outro, eu fui embora e comecei de novo a minha carreira na França.” Da carreira na França à volta ao Brasil Já como professora na França, a pesquisadora viajou a São Raimundo Nonato, no Piauí, em 1970. Conversou com moradores sobre as pinturas rupestres nos sítios da cidade, fotografou o que pôde e voltou três anos depois com um grupo de alunos. Os desenhos encontrados por Niède e seus estudantes abriram portas para uma nova teoria: a de que a chegada do homem às Américas ocorreu muito antes do que se pensava. Suas descobertas indicam uma presença humana anterior à teoria do Estreito de Bering, que data de cerca de 13 mil anos o povoamento das Américas pelo Homo sapiens vindo da Ásia. Morte de Niède Guidon Niède Guidon morreu aos 92 anos, na madrugada desta quarta-feira (4), em São Raimundo Nonato. A informação foi confirmada por Marian Rodrigues, diretora do Parque Nacional da Serra da Capivara. "Partiu como um passarinho, tranquila", relatou a diretora. Arqueóloga Niède Guidon Divulgação Arqueóloga Niède Guidon, aos 86 anos, em sua casa no Piauí. Celso Tavares/G1 Veja mais notícias da região no g1 Bauru e Marília VÍDEOS: assista às reportagens da região

FONTE: https://g1.globo.com/sp/bauru-marilia/noticia/2025/06/04/chacara-dos-avos-e-fuga-para-a-franca-como-foi-a-infancia-e-inicio-de-carreira-de-niede-guidon-que-morreu-aos-92-anos.ghtml


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